terça-feira, 27 de outubro de 2015

Uso Decorativo de Briófitas



    Em nossa última postagem sobre curiosidades e usos das briófitas, vimos um pouco sobre as aplicações e usos diretos de alguns gêneros deste filo, como o Sphagnum, além dos usos medicinais da hepática Marchantia. Nesta iremos comentar a respeito dos mais variados usos decorativos dessas plantas, que vão desde enfeites em decorações natalinas e substrato para o cultivo de orquídeas, até a pintura feita com musgos. 

    Carpetes de musgos do gênero Hypnum, Thuidium e Ptilium são muito populares na decoração de vitrines de lojas, de arranjos florais, sendo bastante utilizados em árvores de natal e outros ornamentos natalinos, como  em árvores de natal e presépios. Este último uso trata-se na realidade de uma tradição andina, que atualmente tem sido adotada pela população que mora nas grandes cidades, fora da região dos Andes. O grande problema disto é que nestes lugares há um grande aumento na colheita de musgos de durante a época do Natal, e o comércio de briófitas cresceu tanto a ponto de se tornar uma ameaça aos ecossistemas tropicais, uma vez que existem plantas vasculares que vivem em simbiose* com briófitas e dependem destas para sua germinação. 

    Musgos do gênero Sphagnum são muito utilizados como substrato no cultivo de orquídeas a partir das sementes, uma vez que possuem grandes propriedades absorventes, são capazes de reter a umidade. O musgo passou a ser utilizado para este fim por conta da proibição do uso de xaxim*, contudo o Sphagnum comercializado no Brasil não é cultivado, e sim extraído da natureza, sendo retirado das beiras de rios. Sua coleta é proibida pelo IBAMA, porém devido a falta de fiscalização e controle, ele ainda pode ser bastante encontrado em lojas especializadas.

    A pintura com musgos tem sido feita na forma de grafite, como um meio de expressão artística "ecologicamente correta", que não envolve o uso de sprays aerossóis e têm um resultado que, visualmente, é muito agradável. A única dificuldade deste tipo de arte é que a pintura necessita de uma certa manutenção, sendo preciso aguar o musgo para que ele não resseque. A receita para um grafite de musgo é relativamente simples, é preparada no liquidificador uma mistura contendo o musgo recentemente coletado, água morna, gel enraizador e soro de leite. Em seguida basta pegar um pincel, molhar nesta mistura e desenhar. São indicadas superfícies de madeira, ou muros antigos, preferencialmente em locais que não estejam diretamente expostos ao sol.

Autora: Michelle Robin


Notas:
1. Simbiose: relação mutuamente vantajosa entre dois ou mais organismos vivos de espécies diferentes;
2. Xaxim: vaso ou adubo fabricado através do corte em fatias do tronco da Pteridófita Samambai-açú, cuja comercialização é proibida desde 2001, devido o risco de extinção)

Referências
GLIME, JM. Bryophyte Ecology. Volume 5. Uses. Ebook patrocinado pela Michigan Technological University e a Associação Internacional de Briologistas. Acessado em 22 de outubro de 2015 em <http://www.bryoecol.mtu.edu/> 

LEON, Y; USSHER, MS. Educational program directed towards the preservation of Venezuelan Andean bryophytes. Journal of the Hattori Botanical Laboratory. Vol. 97, p. 227-231. 2005.

quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Uso econômico das briófitas.




            Em nosso cotidiano é comum prestarmos pouca atenção nas briófitas, tratam-se de organismos pequenos, que infelizmente tendem a passar despercebidos. Porém muito pode ser dito a respeito deles, como sua importância ecológica e a variedade que usos econômicos que elas possuem. Hoje iremos comentar sobre o potencial econômico das briófitas e também um pouco sobre o campo da etnobriologia, ciência que estuda o uso tradicional dos musgos, antóceros e hepáticas, e como os diferentes povos classificam organismos dentro deste grande grupo.
            As briófitas possuem como uma de suas mais marcantes características a sua capacidade de reter água. Por conta disso era comum na Europa até o início do século XX o uso de musgos para a impermeabilização de embarcações. O musgo, do gênero Sphagnum, era utilizado seco, como uma manta, introduzida entre duas tábuas no casco da embarcação.
            Em um estudo feito por Saatkamp¹ em 2011 foram encontrados conjuntos de briófitas dentro dos cascos de 15 barcos na região de Lyons, na França. Outra maneira interessante de fazer uso desta propriedade absorvente foi durante a Primeira Guerra Mundial, em que o Sphagnum era utilizado como bandagem em cirurgias.
            Neste último caso o Sphagnum seria mais vantajoso do que algodão pois é capaz de absorver líquidos mais três vezes mais rápido e uma quantidade de líquido quatro vezes maior, é capaz também de reter o líquido por mais tempo, o que reduz a frequência em que as bandagens precisavam ser trocadas, e tais bandagens eram mais fáceis de serem produzidas em situações de emergência. Mais um fato curioso a respeito deste gênero é que os povos nativos dos Estados Unidos, Canadá e Nova Zelândia costumavam utilizá-lo na composição de fraldas e de absorventes higiênicos.
            O Sphagnum compõe também a turfa, material de origem vegetal, parcialmente decomposto, encontrado em camadas em regiões montanhosas e em grandes altitudes. Sob condições geológicas adequadas (presença de metano) esta turfa transforma-se em carvão, tornando-se inflamável, utilizada como combustível para aquecimento doméstico. Ultimamente tem sido realizadas pesquisas sobre o potencial de remediação biológica da turfa.
            Nas últimas décadas tem tomado importância pesquisas sobre o valor medicinal das briófitas. Harris² em 2008 compilou e documentou aproximadamente 150 espécies de briófitas com uso medicinal, sendo que destas, 28% são ainda exploradas pelos povos nativos norte-americanos e 27% delas são utilizadas na medicina tradicional chinesa. Nesta pesquisa teve destaque a hepática do gênero Marchantia, utilizada no tratamento de queimaduras, e a Polytrichium, de propriedades diuréticas e coagulantes.

Autora: Michelle Robin

Referências
¹ Saatkamp, A. et al. 2011. Moss caulking of boats in upper French Rhône and Saône (Eastern France) from the 3rd to the 20th century and the use of Neckera crispa. Vegetation History and Archeobotany. Vol. 20(4), pg. 293-304.

² Harris, E. 2008. Ethnobryology: traditional uses and folk classification of bryophytes. The Bryologyst. Vol. 111(2), pg. 169-217.

Alam, A. et al. 2015. Bryophytes - The Ignored Medicinal Plants. SMU Medical Journal. Vol. 1(1).

Glime, J.M. 2007. Economic and Ethnic Uses of Bryophytes. In: Flora of North America Editorial Committee, eds. 1993. Flora of North America North of Mexico. 15 vols. New York & Oxford. Vol. 27, pp. 14-41.